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Enzimas de diagnóstico | Biomedicina Padrão

Enzimas de diagnóstico

Por Brunno Câmara - quarta-feira, dezembro 14, 2011

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As enzimas são proteínas com propriedades catalisadoras sobre as reações que ocorrem nos sistemas biológicos. Elas têm um elevado grau de especificidade sobre seus substratos acelerando reações específicas sem serem alteradas ou consumidas durante o processo. O estudo das enzimas tem imensa importância clínica. Em algumas doenças as atividades de certas enzimas são medidas, principalmente, no plasma sanguíneo, eritrócitos ou tecidos. Todas as enzimas presentes no corpo humano são sintetizadas intracelularmente.

A utilidade diagnóstica da medida das enzimas plasmáticas reside no fato que as alterações em suas atividades fornecem indicadores sensíveis de lesão ou proliferação celular. Estas modificações ajudam a detectar e, em alguns casos, localizar a lesão tecidual, monitorar o tratamento e o progresso da doença. No entanto, muitas vezes falta especificidade, isto é, existem dificuldades em relacionar a atividade enzimática aumentada com os tecidos lesados. Isto porque as enzimas não estão confinadas a tecidos ou órgãos específicos, pois estão grandemente distribuídas e suas atividades podem refletir desordens envolvendo vários tecidos.


Glioxalase I humana 

Na prática, a falta de especificidade é parcialmente superada pela medida de vários parâmetros (que incluem várias enzimas). Como as concentrações relativas das enzimas variam consideravelmente em diferentes tecidos, é possível, pelo menos em parte, identificar a origem de algumas enzimas. Por exemplo, apesar das enzimas transaminases ALT (TGP) e AST (TGO) serem igualmente abundantes no tecido hepático, a AST (TGO) apresenta concentração 20 vezes maior que a ALT (TGP) no músculo cardíaco. A determinação simultânea das duas enzimas fornece uma clara indicação da provável localização da lesão tecidual. A especificidade enzimática pode também ser aumentada pela análise das formas isoenzimáticas de algumas enzimas como na lactato desidrogenase.

A seleção de quais enzimas medir com propósitos diagnósticos e prognósticos depende de vários fatores.

AMILASE

A amilase é uma enzima da classe das hidrolases que catalisa o desdobramento do amido e glicogênio ingeridos na dieta. O amido é a forma de armazenamento para a glicose nos vegetais, sendo constituído por uma mistura de amilose (amido não-ramificado) e amilopectina (amido ramificado). A estrutura do glicogênio é similar ao da amilopectina, com maior número de ramificações. A α-amilase catalisa a hidrólise das ligações α-l,4 da amilose, amilopectina e glicogênio, liberando maltose e isomaltose. Não hidrolisa as ligações α-1,6.

A amilase sérica é secretada, fundamentalmente, pelas glândulas salivares (forma S) e células acinares do pâncreas (forma P). É secretada no trato intestinal por meio do ducto pancreático. As glândulas salivares secretam a amilase que inicia a hidrólise do amido presente nos alimentos na boca e esôfago. Esta ação é desativada pelo conteúdo ácido do estômago. No intestino, a ação da amilase pancreática é favorecida pelo meio alcalino presente no duodeno. A atividade amilásica é também encontrada no sêmem, testículos, ovários, tubos de Fallopio, músculo estriado, pulmões e tecido adiposo. A amilase tem massa molecular entre 40.000 e 50.000 daltons sendo, facilmente, filtrada pelo glomérulo renal.

SIGNIFICADO CLÍNICO

A amilase sérica apresenta-se aumentada nas pancreatites agudas e crônicas. Pode ainda estar aumentada nas condições em que o paciente é portador de pseudo-cisto pancreático, perfuração intestinal com peritonite, gravidez ectopica e patologias que comprometam as vias biliares. A dosagem da amilase sérica é utilizada como meio laboratorial diagnóstico na parotidite epidêmica (caxumba) que ocorre principalmente em crianças.

LIPASE

A lipase é uma enzima altamente específica que catalisa a hidrólise dos ésteres de glicerol de ácidos graxos de cadeia longa (triglicerídeos) em presença de sais biliares e um cofator chamado colipase. As ligações éster, nos átomos de carbono 1 e 3 são preferentemente rompidas, produzindo dois mol de ácidos graxos de cadeia longa e um mol de 2-acilmonoglicerídio por mol de triglicerídeo hidrolisado. Tanto a lipase como a colipase são sintetizadas pelas células acinares do pâncreas. A lipase também é encontrada na mucosa intestinal, leucócitos, células do tecido adiposo, língua e leite.

SIGNIFICADO CLÍNICO

A lipase é um marcador mais específico de doença pancreática aguda do que a amilase. Seus níveis estão aumentados em pacientes com   pancreatite   aguda   e   recorrente,   abscesso   ou   pseudocisto pancreático, trauma,  carcinoma  de  pâncreas,  obstrução  dos  ductos pancreáticos e no uso de fármacos (opiáceos). Está também aumentada na maior parte das condições inflamatórias da cavidade abdominal, doenças do trato biliar, abscessos abdominais e insuficiência renal aguda e crônica (com menor freqüência do que a amilase).

 

FOSFATASE ALCALINA

A fosfatase alcalina (FA) pertence a um grupo de enzimas relativamente inespecíficas, que catalisam a hidrólise de vários fosfomonoésteres em pH alcalino. O pH ótimo da reação in vitro está ao redor de 10, mas depende da natureza e concentração do substrato empregado. A fosfatase alcalina está amplamente distribuída nos tecidos humanos, notadamente na mucosa intestinal, fígado (canalículos biliares), túbulos renais, baço, ossos (osteoblastos) e placenta. A forma predominante no soro em adultos normais origina-se, principalmente, do fígado e esqueleto. Apesar da exata função metabólica da enzima ser desconhecida, parece estar associada com o transporte lipídico no intestino e com processos de calcificação óssea.

No fígado, a fosfatase alcalina está localizada na membrana celular que une a borda sinusoidal das células parenquimais aos canalículos biliares. Nos ossos a atividade da fosfatase alcalina está confinada aos osteoblastos onde ocorre a formação óssea.

SIGNIFICADO CLÍNICO

Os níveis de Fosfatase Alcalina sérica são de grande significado na investigação das desordens hepatobiliares e ósseas. Nas enfermidades hepatobiliares, as elevações são encontradas, predominantemente, na obstrução extra-hepática (cálculo vesical, câncer de cabeça do pâncreas). Na obstrução do trato biliar, a atividade da fosfatase alcalina pode estar elevada até dez vezes em relação aos mais altos valores de referência.

O aumento da fosfatase alcalina encontrase presente em várias enfermidades ósseas, especialmente naquelas que evoluem com quadro de osteólise. A doença de Paget talvez seja, a doença óssea que apresente as maiores atividades de fosfatase alcalina, com níveis 10 a 25 vezes acima dos limites superiores dos valores de referência.
Discretos aumentos se verifi cam na osteomalácia, raquitismo, hiperparatireoidismo, fraturas e durante o crescimento ósseo. Níveis elevados de fosfatase alcalina são encontrados no sarcoma osteogênico. Discreto ou  moderados aumentos podem ser observados durante a gravidez, sendo essa fosfatase de origem placentária.

 

FOSFATASE ÁCIDA

O termo fosfatase ácida (FAC) designa um grupo heterogêneo não-específico de fosfatases que exibem pH ótimo entre 4,5 e 7, e catalisam a hidrólise de monoéster ortofosfórico produzindo um álcool e um grupo fosfato. A fosfatase ácida é amplamente distribuída nos tecidos. A maior atividade é encontrada na glândula prostática (1000 vezes maior que em outros tecidos), células osteoblásticas do osso, fígado, baço, rins, eritrócitos e plaquetas. Em homens adultos, a próstata contribui com quase a metade da enzima presente no soro.

Em indivíduos do sexo masculino, a fração prostática representa em torno de 50% da fosfatase ácida total, sendo o restante proveniente do fígado e de desintegração das plaquetas e eritrócitos. Para o sexo feminino é proveniente do fígado, eritrócitos e plaquetas. Os níveis de fosfatase ácida no soro apresentam importância clínica no diagnóstico e monitorização do câncer prostático, em especial pelo emprego da fração prostática da fosfatase (FACP).

SIGNIFICADO CLÍNICO

A determinação da atividade da fosfatase ácida no soro tem como principal finalidade o diagnóstico e a monitorização do câncer prostático e particularmente o da forma metastática. A fosfatase ácida total e seu isoenzima fosfatase ácida prostática encontram-se aumentados nos casos de adenocarcinoma prostático. O aumento é mais evidente nas condições em que já há infiltração da pseudo cápsula com metástases por vias hematogênica e linfática. Os aumentos são mais acentuados com relação à fosfatase ácida prostática.

Discretos aumentos de fosfatase ácida total são encontrados na enfermidade de Paget, anemia hemolítica e anemia megaloblástica. A fosfatase ácida total é utilizada como marcador da doença de Gaucher. O antígeno prostático específico (PSA), fração antigênica específica do tecido prostático, vem substituindo, progressivamente, através de sua dosagem a dosagem das fosfatases ácidas devido a sua maior especificidade e sensibilidade.

AMINOTRANSFERASES (TRANSAMINASES)

As enzimas aspartato aminotransferase, AST (transaminase glutâmico-oxalacética, TGO) e alanina aminotransferase, ALT (transaminaseglutâmica-pinúvica, TGP) catalisam a transferência reversível dos grupos amino de um aminoácido para o α-cetoglutarato, formando cetoácido e ácido glutâmico. Estas reações requerem piridoxal fosfato como coenzima:

Aspartato + α-cetoglutarato clip_image002 oxalacetato + ácido glutâmico
Alanina + α-cetoglutarato
clip_image002[4] piruvato + ácido glutâmico

As reações catalisadas pelas aminotransferases (transaminases) exercem papéis centrais tanto na síntese como na degradação de aminoácidos. Além disso, como estas reações envolvem a interconversão dos aminoácidos a piruvato ou ácidos dicarboxílicos, atuam como uma ponte entre o metabolismo dos aminoácidos e carboidratos.

As aminotransferases estão amplamente distribuídas nos tecidos humanos. As atividades mais elevadas de AST (TGO) encontram-se no miocárdio, fígado, músculo esquelético, com pequens quantidades nos rins, pâncreas, baço, cérebro, pulmões e eritrócitos.

SIGNIFICADO CLÍNICO

O TGO é uma enzima encontrada em altas concentrações no músculo cardíaco, músculos esqueléticos, hepatócitos e em menor escala no pâncreas e rins. A dosagem de TGO sérico está limitada, atualmente, ao estudo das hepatopatias. Aumento de TGO é encontrado nas hepatites virais agudas ou crônicas, hepatite por drogas, cirrose alcoólica, hemocromatose, icterícias hemolíticas e nos tumores primitivos ou metastáticos do fígado.

O TGP é encontrada predominantemente no hepatócito, sendo de localização citoplasmática. Agressões ao hepatócito  (vírus, medicamentos, toxinas) levam a liberação de TGP. Os níveis mais elevados de TGP sérico são encontrados nas hepatites virais agudas, podendo os mesmos atingir a milhares de U.I./L. Não existe paralelismo entre o nível sérico de TGP e gravidade da lesão.

GAMA-GLUTAMILTRANSFERASE

A γ-glutamiltransferase (γ-GT) catalisa a transferência de um grupo γ-glutamil de um peptídio  para  outro  peptídio  ou  para  um  aminoácido produzindo  aminoácidos γ-glutamil e cistenilglicina. Está envolvida no transporte de aminoácidos e peptídios através das membranas celulares, na síntese protéica e na regulação dos níveis de glutatião tecidual. A γ-GT é encontrada no fígado, rim, intestino, próstata, pâncreas, cérebro e coração.

SIGNIFICADO CLÍNICO

A dosagem de γ-GT pode ser vista como uma prova de estudo da capacidade excretora do fígado. Embora a enzima se apresente aumentada nas hepatites agudas, é principalmente nas formas colestáticas que mostra aumentos consideráveis. Seu estudo é de grande ajuda nas colestases intra e extra hepáticas, nas quais se encontra grandemente aumentada.

 

LACTATO DESIDROGENASE (DHL)

A lactato desidrogenase (DHL) é uma enzima da classe  das  oxidorredutases  que  catalisa  a oxidação reversível do lactato a piruvato, em presença da coenzima  NAD+ que atua como doador ou aceptor de hidrogênio.

A DHL está presente no citoplasma de todas as células  do  organismo.  Sendo  rica  no  miocárdio, fígado, músculo esquelético, rim e eritrócitos. Os níveis teciduais de DHL são, aproximadamente, 500 vezes maiores do que os encontrados no soro e lesões naqueles tecidos provocam elevações plasmáticas significantes desta enzima.

SIGNIFICADO CLÍNICO

A DHL é encontrada no músculo cardíaco, fígado, eritrócitos, pulmões,  musculatura esquelética e nos rins. No infarto agudo do miocárdio, a DHL torna-se elevada dentro de 24-48 horas após o infarto, atingindo um valor máximo entre  48-72 horas. A partir de então, lentamente (de 5 a 10 dias), retorna aos valores normais.

Na lesão hepatocelular aguda, o valor total da DHL não é  tão sensível quanto o da AST. Na congestão hepática passiva, aguda ou crônica, de grau leve, a DHL apresenta-se muitas vezes normal, ou apenas levemente aumentada. Na congestão moderada ou grave, a elevação dos níveis de DHL varia, podendo ocorrer em menor ou maior grau.

As próteses valvulares cardíacas podem produzir grau suficiente de hemólise, a ponto de alterar os valores séricos de DHL. Além disso, a DHL mostra-se anormal em muitos pacientes com anemia megaloblástica e com anemias hemolíticas moderadas ou graves. A DHL pode estar elevada em pacientes com embolia pulmonar, neoplasias malignas, leucemia ou uremia.

 

CREATINA QUINASE (CK)

A enzima creatina quinase (CK) catalisa a fosforilação reversível da creatina pela adenosina trifosfato (ATP) com a formação de creatina fosfato. A CK está associada  com  a  geração de ATP nos sistemas contráteis ou de transporte. A função  fisiológica  predominante  desta  enzima ocorre nas células musculares, onde está envolvida no armazenamento de creatina fosfato (composto  rico  em  energia).  Cada  ciclo  de  contração muscular promove o consumo de ATP com formação de ADP.

A creatina quinase está amplamente distribuída nos  tecidos,  com  atividades  mais  elevadas  no músculo  es quelético,  cérebro  e  tecido  cardíaco. Quantidades  menores  são  encontradas  no  rim, diafragma,  tireóide,  placenta,  bexiga,  útero,  pulmão,  próstata,  baço,  reto,  cólon,  estômago  e pâncreas.  O  fígado  e  eritrócitos  são  essencialmente desprovidos desta enzima.

SIGNIFICADO CLÍNICO

A  CK é um dimer composto de duas subunidades:  M (muscle-músculo) e  B (brain-cérebro). A composição dessas duas subunidades resulta em três isoenzimas: MM, MB e BB. Níveis elevados de CK  são encontrados em infarto agudo do miocárdio. A elevação já é constatada 6 horas após o início do quadro e atinge o ápice em torno de 24 horas, permanecendo os valores elevados por 72 a 96 horas.

Valores elevados são encontrados na distrofia muscular progressiva (tipo Duchene). Níveis elevados de CK tem sido encontrados em pacientes portadores de hipotireoidismo e nos politraumatisados. A determinação da isoenzima  CK-MB em pacientes com suspeita de infarto do miocárdio confere especificidade ao diagnóstico.

Referências:
VALTER T. MOTTA: Bioquímica Clínica: Princípios e Interpretações.
Doles Reagentes <http://migre.me/79jfQ>

Brunno Câmara Autor

Brunno Câmara - Biomédico, CRBM-GO 5596, habilitado em patologia clínica e hematologia. Docente do Ensino Superior. Especialista em Hematologia e Hemoterapia pelo programa de Residência Multiprofissional do Hospital das Clínicas - UFG (HC-UFG). Mestre em Biologia da Relação Parasito-Hospedeiro (imunologia, parasitologia e microbiologia / experiência com biologia molecular e virologia). Criador e administrador do blog Biomedicina Padrão. Criador e integrante do podcast Biomedcast.
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